segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Maria Gadú registra as mudanças em sua vida em seu segundo disco

  Mais uma página’ mapeia a vivência intensa da cantora desde a estreia, em 2009

A cantora Maria Gadú: uma vida louca vida desde a estreia, em 2009


RIO - Maria Gadú regravou “Oração ao tempo”, de Caetano Veloso, por uma sugestão de Jayme Monjardim, que queria a canção na novela “A vida da gente”. Mas a música, que acabou se tornando a faixa 6 do novo CD da cantora, “Mais uma página” (Slap), apesar de originalmente pensada para uma trilha sonora, funciona como uma espécie de norte para o qual o disco a todo tempo parece remeter de alguma forma. Afinal, o álbum (seu segundo de estúdio, com toda a carga simbólica que isso traz) mapeia exatamente os efeitos do tempo (“tempo, tempo, tempo, tempo”, ecoa o verso ao longo da canção) sobre a cantora nos últimos dois anos, quando ela saiu do anonimato para se tornar um dos nomes mais populares da sua geração. De lá para cá, mais de 400 mil CDs e DVDs vendidos, uma turnê com Caetano, um punhado de prêmios, viagens.

— É um registro de como minha vida mudou, tudo o que está gravado é o que aconteceu comigo nesses dois, três anos — resume Gadú, de 25. — A impressão que tenho é a de que passou muito mais tempo desde os meus primeiros shows no Cinematheque (em 2009, poucos meses antes de lançar seu CD, no mesmo ano). Quando Jayme me ligou convidando para gravar “Oração ao tempo”, eu estava ouvindo essa música em loop, até por ter tanta coisa acontecendo na minha vida. Perguntei: “Onde você mora? Na minha cabeça?”

A vivência intensa do período foi filtrada para um disco que reafirma as bases plantadas em seu primeiro trabalho. Seu olhar sereno sobre o produto aparece em “No pé do vento”, faixa de abertura, parceria de Gadú com Edu Krieger. “Mais uma página do mesmo livro/ Mais uma parte da mesma história”, dizem os versos. No fim, sua resposta definitiva ao clássico desafio do segundo CD, quase uma carta de intenções do álbum: “Cantando eu vivo em movimento/ E sem ser mais do mesmo/ Ainda sou quem era”.

— Fiz o disco no tempo dele, com muita naturalidade. A expectativa (da imprensa, da gravadora) não me afeta. A cobrança mais saudável é a das pessoas que me acompanham, não gosto de usar a palavra “fãs”. Sou muito grudada com elas, que vão lá em casa, saem para beber comigo quando vou à cidade delas... Elas pediam: “Grava outro disco, quero mais música sua”. Mas é algo tranquilo.

O registro da passagem do tempo pela vida de Gadú aparece de forma menos ou mais evidente ao longo das 15 faixas (uma delas, “Beleza”, escondida no fim do CD). Atravessando o disco, ele está na sonoridade. Se na estreia a banda tinha acabado de conhecer a cantora, agora eles são um núcleo — Cesinha (bateria), Fernando Caneca (guitarra e violões), Doga (percussão), Gastão Villeroy (baixo), Maycon Ananias (teclados) e Rodrigo Vidal (programação) — que já se entende pelo olhar.

— Esse soa mais inteiro. O primeiro foi todo baseado na minha voz e violão, que ficaram o tempo todo muito na frente. Os arranjos eram do jeito que sempre tinha tocado. Esse veio com sonoridade de banda. Regravei “Amor de índio” (de Beto Guedes e Ronaldo Bastos) , por exemplo, com o arranjo que construímos ao vivo, juntos — nota Gadú, que chama atenção para o fato de ter gravado mais guitarra que violão no CD.

A passagem de Caetano por sua vida se reflete no álbum de forma explícita, não só em “Oração ao tempo”, mas sobretudo em “Estranho natural”, que ela compôs para o ídolo e parceiro de palco. Os versos: “Meu canto hoje dobra tuas notas/ Me olhas como se fosse normal/ Me coro ao seguir a tua rota/ Meu abraço te amarrota/ Meu estranho natural”. Ela fala do encontro com o baiano sem esconder seu deslumbre, numa sinceridade despida de qualquer tom blasé — o mesmo acontece quando ela menciona Lenine (que faz um dueto com ela em “Quem?”) ou Gilberto Gil (que a convidou para gravar com ele em seu CD/ DVD “Gil +10”).

— Falo deles assim porque a música me deixa muito feliz mesmo, adoro isso. Acho que a ficha (de que é natural estar do lado dessas pessoas) nunca vai cair. Até porque falo da mesma forma de meus amigos de anos, compositores talentosíssimos como Daniel Chaudon, Dani Black...
Black representa no disco a (grande) turma da paulistana Gadú, de jovens cantores-compositores que estão chegando com seus CDs de estreia. Ele aparece no disco com duas composições (“Axé acapella”, com Luísa Maita, e “Linha tênue”).

Amizades mais recentes também estão ali, como Ana Carolina (parceira de Gadú e Chiara Civello em “Reis”). E suas viagens pelo mundo, o contato com artistas internacionais, aparecem, além da assinatura da italiana Chiara, nas duas parcerias com o americano Jesse Harris (autor de “Don’t know why”, de Norah Jones), na participação do cantor português Marco Rodrigues e nas cordas da Orquestra Filarmônica de Praga.

— Sempre fui viajante, morei fora. “Sou pássaro no pé de vento”, como canto no CD. Sempre fui mochileira, desde os 12, 13 anos quando falei para minha mãe que ia estudar na casa de um amigo e viajei para o Paraguai. Olha o tamanho do mundo! Por que vou ficar num lugar só?

A turnê do novo CD estreia entre março e abril no Vivo Rio. Ignorando as expectativas dos outros sobre o CD, Gadú revela que as suas inexistem:
— Ele tem vida própria, não quero nada por ele. Fazer canção me alivia, me liberta para dar continuidade, seguir para as outras páginas.

- O Globo - 

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